Hoje tem cantada barata? Tem sim senhor!

novembro 6, 2009 at 5:38 pm (As do bar)

Depois de alguns anos circulando pela noite, adquiri uma dúvida existencial: será que existe vida inteligente depois da meia-noite? Estou generalizando o horário, claro. O que considero é a transformação que acontece depois de uma certa hora, quando a cerveja, a tequila ou seja lá o que tiver o álcool que for, toma conta do cérebro. Em uma mesma noite, uma mulher é capaz de ouvir umas dez ou quinze cantadas sem graça. O pior é que, com algumas delas, cola. Será que o pior é não colar? Outra dúvida que me aflige. Ser um pouquinho mais flexível não ajudaria a encontrar o pai dos meus filhos? As várias sessões de terapia ainda não conseguiram me convencer disso. Bom, também não é tão difícil assim de entender. Basta que eu cite um exemplo.

Desculpe, ainda não me apresentei. Meu nome é Alice. No verão, gosto de ir para o bar de uns amigos. Cerveja gelada, atendimento preferencial e a promessa de sempre ter uma boa companhia. Na última temporada, estávamos eu, Larissa e Roberta, sentadas a uma mesa ao ar livre. Conversa vai, conversa vem, entram três caras no bar, escolhem se instalar ao nosso lado. Pelos olhares de conquistadores baratos que pude perceber com o canto do olho, senti que minha tranqüilidade acabaria em alguns instantes. Eu havia sido quase assaltada duas noites antes e estava contando, com toda a minha indignação, o susto que levei. Dizia que não acreditava em reabilitação, que esse tipo de cara tem que morrer mesmo para não aterrorizar mais ninguém.

– Mina, quer dizer então que tu é a favor da violência? Diz um dos seres da mesa ao lado. Para começo de conversa, não me chama de mina. E depois, coisa feia enfiar o bedelho onde não se é chamado, muito menos, bem-vindo. Não respondi, nem sequer olhei para o lado. Continuei a falar com minhas amigas, agora concentrada nas histórias que elas tinham para contar. Fazia tempo que não nos víamos. Mais um pouco de conversa, mais uma intervenção.

– Ei, uma de vocês empresta o fogo? Ok, até aí nada demais. Roberta alcançou o isqueiro. Ela estava curtindo a azaração, afinal, não era o tipo de mulher preferência nacional. Faltava-lhe um bom bocado de atributos para chegar lá. Larissa continuava sem se manifestar, como eu. O isqueiro acendeu a chama para novas tentativas.

– Vocês são daqui? Roberta prontamente respondeu sim, que éramos as três veranistas de Areias Brancas.

– Vão passar o carnaval aqui também? Eu e Larissa já estávamos cansadas da falta de noção das criaturas. Roberta continuava alimentando.

– Escuta mina, tuas amigas engoliram a língua? Pô, nós só queremos conhecer vocês melhor, curtir a noite, três minas, três manos.

Gota d´água. Eu e Larissa levantamos e, sem dar tempo nem escolha para Roberta, fomos para o balcão, onde imaginávamos estar a salvo. Passaram-se alguns minutos, o trio incansável se aproximou novamente. Os meninos não eram feios, mas e quem disse que isso tem tanto valor assim? Dessa vez, chegam com um novo trunfo. Um deles vem ao encontro de Roberta e oferece uma carteira de cigarros. Aproxima-se da mais faceira com um agrado, para ver se consegue uma brecha com as indiferentes. Boa estratégia! Mas a grande sacada não dura mais do que meia hora. O mesmo garoto chega todo desajeitado pedindo o maço de Carlton de volta. Ele diz que havia o achado perdido em uma mesa e que o dono tinha voltado para buscar. Como diria um amigo meu, aí enfraquece! Que falta de talento!

A noite seguiu. Depois de muita Skol, o conceito de beleza dos meninos se tornou relativo e bastante flexível. Roberta ficou com pena da bola fora com o maço de cigarros e voltou para casa mais sorridente. Mesmo vendo a felicidade dela, não me convenço. Será que meu destino é ficar na companhia das amigas, desviando dos cérebros vazios e alcoolizados? Enquanto não encontro resposta para minhas inquietações, continuarei dando boas risadas com o grande circo que só a noite pode proporcionar.

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