Mas não é?

janeiro 14, 2010 at 6:58 pm (As do bar)

– Não incentivo putaria, vai trabalhar!

Contou ele, arrancando-nos risos.

– Mas não é?  

De segunda a sexta, aquele boteco abria suas portas de manhã e as fechava somente no início da noite. Opções não faltavam: dava para despertar com um café ou regulando a lenta com uma dose de cachaça, vulgo veneninho. Em horário de almoço, tinha o prato do dia. Ao entardecer, era o momento de sorver a tensão e o cansaço em vários goles de algo etílico. O ambiente, apesar de tumultuado, era agradável. Dos engravatados aos de bermuda e chinelo. Todos tinham o mesmo espaço e tratavam-se como se fossem amigos de infância. A estrutura espremida facilitava a conversa, que às vezes se transformava em uma só. Todos se respeitavam e cumprimentavam sem que fosse preciso estabelecer regra para isso. Foi a minha primeira vez e já me senti em casa. As portas estavam para fechar, bebia o primeiro gole do meu último chope. Um casal de jovens chegou para esperar o garçom. Não que eu tivesse alguma coisa a ver com isso, mas ficou a dúvida de quem a menina namorava. Bebi mais um gole e observei os três homens que estavam na mesa ao lado. Um deles se destacava. Sotaque nordestino, mal vestido, meio careca e banguela. Contador de histórias. Falava do tempo em que era militar, dos pais que foram assassinados, do preparo de uma bebida com maracujá. O senhor bem alinhado que estava junto, olhava para mim e dizia: esse é fera! Levantava o copo fazendo um brinde coletivo no ar. O trio, garçom mais casal, despediu-se indo em direção a saída.

 – E aí amiguinha, ta namorando qual dos dois? Gritou o nordestino. Sabe, já vi essa moça com tantos diferentes. Os risos surgiram em coro.

Fazer o que em uma hora dessas.

Mas olha, que fura-olho esse velho! Comentou um dos companheiros de trago.

Na mesma hora ele tirou o celular do bolso e mostrou uma foto da tal menina.

– Essa foto, ela que pediu pra eu tirar. Foi no dia em que ela me viu entrar no meu Tucson.

Paramos de beber. Ele continuou.

 – Ela chegou mais perto, perguntando como é que eu, feio, banguela e careca tinha um carrão desses.

– Pois minha filha sou feio, mal vestido, banguela, careca e o diabo, mas tenho uma aposentadoria de seis mil reais por mês!

Ele explicou que era engenheiro eletrônico e militar aposentado. A moça perguntou quanto ele pagaria para sair com ela.

– Lhe dou dez reais, pra você pegar um táxi até sua casa. Mas não é? Ele nos indagou.

– Mas sou gatinha, novinha, onde tu vai conseguir uma assim como eu?

– Minha filha, quantos anos você tem?

– Vinte e seis.

– Pois olhe, eu tenho uma esposa que amo em casa, da sua idade.

– Ah, mas um motelzinho pra sair da rotina. Duvido que ela faça como eu.

– Só se for no motel das estrelas.

– Esse eu nunca fui, deve ser chique! Onde fica?

– Ora, no meio do mato menina. Ta pensando que vou gastar um puto com você?

Mas não é?

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