A trilha nossa de cada dia

setembro 1, 2010 at 8:01 pm (As minhas)

O ápice de Dani California divide as atenções com a sinfonia do bizarro. Trilhar o caminho mais barato e rápido até em casa tem lá suas peculiaridades.

 Sete e meia da noite é hora em que a fauna espera ansiosa pela abertura das porteiras automáticas. E o atropelo começa, como se não houvesse amanhã. É o instinto miserável berrando “sai da frente, minha necessidade é maior que a sua!” As grávidas, as com criança no colo e os deficientes que procurem alguém com boa educação. Óculos escuro, um sono repentino ou um fone de ouvido, todos salvam nessa hora. Meu ouvido mistura o auge da quebradeira com o ritmo frenético de pessoas entrando e saindo.  O cara rindo sozinho, a gordinha mergulhada num fandangos de presunto com Coca-cola.

O telefone toca, engano. Só pra interromper o esmerilhar da gaita. Pink. As unhas da menina sentada ao meu lado são assim. Exceto a do meio, que é dourada. Vai entender.

O ventilador de teto leva a minha paciência pra bem longe. Já não basta a gangue dos Janela Fechada pra sufocar o pouco ar que divido com o mundo inteiro dentro do vagão.

Alright.  Acho que não. Ao tirar um dos olhos do papel, me deparo novamente com o Circo dos Horrores. A da unha dourada pensa que meu ouvido está disponível pro pagodinho dela.

A cada estação, eu me convenço mais de que “tem gente que acha que é bonito ser feio”. Gente que se acha a bolacha mais recheada. E quanto recheio, transborda o piercing do umbigo, o cós da cintura baixa e do baixo nível.

Highway to Hell. Já estamos no meio do caminho e no fim da tolerância. Cheiro de Cheetos Bolinha. Paciência. É preciso muito esforço pra fingir tê-la.

Será que 2012 já chegou e esqueceram de avisar? É o fim. Da linha e da picada. Pelo menos até amanhã cedo.

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O Encantador de Carnes

setembro 1, 2010 at 4:43 pm (As minhas)

Naquela cumbuca pendurada, ninguém mais metia a mão. Ela ficou famosa por moer o dedo dos curiosos. Dos fuxiqueiros. Daqueles que se preocupavam mais com a vida dos outros do que com a integridade de suas mãos. A quantidade de dedos desfiados mostrava o quanto a falta de bom senso repartia aquela cidade e demonstrava, através de sinais físicos, a moral do seu povo.

A distância da cumbuca era uma lição que martelava em todas as cabeças. Pelo menos até o dia em que todas despertaram com um mugido de rasgar ouvidos, seguido de uma voz grave que anunciava “O encantador de carnes chegou”. “Abram suas portas, dêem boas-vindas ao pedaço mais saboroso da cidade”.  A voz vinha de um jovem franzino, desacreditado de sua imponência vocal. Era o açougueiro estrangeiro, que estava abrindo as portas da sua Boutique de Carnes naquela cidade que não dava boas-vindas ao desconhecido.

Agora a cumbuca fazia parte do passado. Quem era esse rapaz? Ou melhor dizendo, quem ele pensava que era pra chegar assim, invadindo território?

Quanta pretensão!  Dizia a senhora com cara de sono e bobs no cabelo.

Como o prefeito não mandava prender um desaforado desses! Estufava o peito o senhor de pijama listrado, tragando seu Charm com os dois dedos que lhe sobravam inteiros.

O som do burburinho trouxe o desconforto e a certeza de que a cumbuca não havia dado conta de acalmar essa gente fuxiqueira. Na manhã seguinte, os cidadãos foram acordados com ópera, num tom tão agudo que, mais do que rasgar, retalhou os tímpanos. A partir de então, todos ouviam a mesma melodia, tão intensa que o cérebro ameaçava partir-se em pedaços.

Mesmo atordoados, ainda sobrava lucidez para as críticas.

– Que raio de som é esse?  Indagava a jovem com o cachorro no colo.

– Ãh? Não estou ouvindo nada! Dizia o namorado espinhento.

Findou-se mais um dia e as ideias começaram a fazer fila na cabeça do encantador de carnes. O sol nasceu e as campainhas tocaram. Uma bandeja e o cartão “Saboreiem, vão faltar palavras!” guardavam um suculento e generoso naco de filé.  Passadas algumas horas, o recado dado podia ser apreciado no meio da praça: gritos silenciosos de quem perdera não só os dedos e a audição, mas agora a fala.

– Jorge! Jorge! Tudo bem com você? Pergunta Marcos, apavorado.

– Ãh…acho que me distraí quando aquela gostosa pediu a picanha…

Marcos vê sangue escorrendo ao lado, desvia o olhar e logo percebe o generoso talho no indicador de Jorge.

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Tim-tim

fevereiro 19, 2010 at 7:29 pm (As do bar)

Uma Skol. Um lugar ocupado na mesa mais isolada do bar. Três cadeiras vazias. Dois copos cheios. A mesma cena se repete todo sábado. O protagonista da história é Fernando. Ele serve um copo à sua frente e o outro ao lado, como se esperasse por companhia para o brinde. Depois de simular o tim-tim , de gole em gole, ele degusta o ambiente e finaliza a cerveja. Deixa o copo da acompanhante intacto, vai até o balcão, encerra a conta e a noite. O copo que fica cheio é de Isabel. Ela não sabe o nome dele. E ele só sabe o que vê e ouve das conversas com as amigas, que estão sempre em uma mesa próxima. Loira, olhos claros, corpulenta, estudante de química. Solteira e decepcionada com os homens. A esperança silenciosa de fazê-la mudar de opinião é o que garante a repetição do ritual. Ele olha, imagina, ensaia uma aproximação, recua. Faltam mais uns goles de coragem. Certa noite, enquanto Fernando enxerga seu primeiro beijo com Isabel no fundo do copo, é interrompido com a pergunta:

– Você não cansa de beber sozinho?

Ele não acredita no que vê. É ela, a dona do copo e do seu coração! Fernando congela.

– Você só bebe, não fala não é?

Ele continua mudo.

– Você é bom demais pra perder tempo com uma desajeitada e gorda como eu?

Não conseguindo contrariar as conclusões, ele continua imóvel.

– Ah, não é isso! Você pensa que tomar iniciativa é coisa de desesperada, de mulher fácil?

Quanto mais ela fala, mais ele quer ficar calado.

– Tô fazendo papel de palhaça! Pode rir! Pelo menos eu tentei! Um dia você vai ser rejeitado também, pode escrever!

Isabel não imaginava que o tempo, o papel e a caneta eram inúteis, a recusa já acontecera. Assim que ela virou as costas, Fernando sentiu um alívio confuso. Bebeu a sobra da Skol e pediu a segunda ao garçom. Brindou a ele mesmo. Naquele instante, libertou-se da louca disfarçada de amor da sua vida.

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Mas não é?

janeiro 14, 2010 at 6:58 pm (As do bar)

– Não incentivo putaria, vai trabalhar!

Contou ele, arrancando-nos risos.

– Mas não é?  

De segunda a sexta, aquele boteco abria suas portas de manhã e as fechava somente no início da noite. Opções não faltavam: dava para despertar com um café ou regulando a lenta com uma dose de cachaça, vulgo veneninho. Em horário de almoço, tinha o prato do dia. Ao entardecer, era o momento de sorver a tensão e o cansaço em vários goles de algo etílico. O ambiente, apesar de tumultuado, era agradável. Dos engravatados aos de bermuda e chinelo. Todos tinham o mesmo espaço e tratavam-se como se fossem amigos de infância. A estrutura espremida facilitava a conversa, que às vezes se transformava em uma só. Todos se respeitavam e cumprimentavam sem que fosse preciso estabelecer regra para isso. Foi a minha primeira vez e já me senti em casa. As portas estavam para fechar, bebia o primeiro gole do meu último chope. Um casal de jovens chegou para esperar o garçom. Não que eu tivesse alguma coisa a ver com isso, mas ficou a dúvida de quem a menina namorava. Bebi mais um gole e observei os três homens que estavam na mesa ao lado. Um deles se destacava. Sotaque nordestino, mal vestido, meio careca e banguela. Contador de histórias. Falava do tempo em que era militar, dos pais que foram assassinados, do preparo de uma bebida com maracujá. O senhor bem alinhado que estava junto, olhava para mim e dizia: esse é fera! Levantava o copo fazendo um brinde coletivo no ar. O trio, garçom mais casal, despediu-se indo em direção a saída.

 – E aí amiguinha, ta namorando qual dos dois? Gritou o nordestino. Sabe, já vi essa moça com tantos diferentes. Os risos surgiram em coro.

Fazer o que em uma hora dessas.

Mas olha, que fura-olho esse velho! Comentou um dos companheiros de trago.

Na mesma hora ele tirou o celular do bolso e mostrou uma foto da tal menina.

– Essa foto, ela que pediu pra eu tirar. Foi no dia em que ela me viu entrar no meu Tucson.

Paramos de beber. Ele continuou.

 – Ela chegou mais perto, perguntando como é que eu, feio, banguela e careca tinha um carrão desses.

– Pois minha filha sou feio, mal vestido, banguela, careca e o diabo, mas tenho uma aposentadoria de seis mil reais por mês!

Ele explicou que era engenheiro eletrônico e militar aposentado. A moça perguntou quanto ele pagaria para sair com ela.

– Lhe dou dez reais, pra você pegar um táxi até sua casa. Mas não é? Ele nos indagou.

– Mas sou gatinha, novinha, onde tu vai conseguir uma assim como eu?

– Minha filha, quantos anos você tem?

– Vinte e seis.

– Pois olhe, eu tenho uma esposa que amo em casa, da sua idade.

– Ah, mas um motelzinho pra sair da rotina. Duvido que ela faça como eu.

– Só se for no motel das estrelas.

– Esse eu nunca fui, deve ser chique! Onde fica?

– Ora, no meio do mato menina. Ta pensando que vou gastar um puto com você?

Mas não é?

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O despertar de um homem

novembro 27, 2009 at 4:38 pm (As minhas)

Naquela noite o Pub Fiction recebia um show inédito. Lily e Bety, as gêmeas da cinta-liga. Ruivas e estonteantes. Abrem-se as cortinas. A meia-luz coberta pela névoa do tabaco é invadida pelos holofotes e luzes coloridas. As coxas torneadas de Lily aparecem ao mesmo tempo que as de Bety saindo das coxias. Elas seduzem com seu rebolado e suas curvas bem definidas.

Lily usa um corpete vermelho. Bety está toda de negro, com uma rosa vermelha presa na perna. As gêmeas arrancam suspiros dos homens presentes, e também gargalhadas. Elas dançam de um jeito engraçado. Como duas marionetes, seus movimentos são simétricos, bem marcados. Os olhos de Roberto dançam junto com as moças, no mesmo compasso, para lá e para cá. Ele está tão enfeitiçado, que mal percebe a aproximação de Bety. A ruiva de negro estende sua perna e fixa seus olhos nos dele com malícia, fazendo um convite silencioso: Leve essa rosa e jamais me esquecerá.

O momento é interrompido por um som estranho, mas familiar para Roberto. De repente, ele não vê mais Bety, nem a rosa. Tampouco avista o palco, seu uísque e seu cigarro. Ao seu lado estão o criado-mudo e dois ponteiros lhe dizendo que são seis horas da manhã. Roberto levanta de uma só vez, como se a cama o expulsasse. Corre para o chuveiro. Às oito horas está marcada a apresentação da campanha de inauguração do novo cliente: Das Gêmeas Lingeries e Acessórios.

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Contra o tempo

novembro 19, 2009 at 1:05 pm (As minhas)

É domingo e um ninho gigante posicionado bem no canto da minha cama me lembra que a Páscoa chegou. Minha mente logo já cria o cenário: o coelho branco e fofinho entrou em casa pelas grades do pátio. Ou talvez, em um impulso, tenha conseguido saltar o telhado até o meu quarto, entrando pela janela do banheiro. Tudo isso segurando a cesta com os chocolates pendurada em uma das patas. Ele sabe que eu gosto de Ouro Branco e Diamante Negro. Meus lábios sorriem sem que eu perceba. 

Toda a vez que degusto um chocolate, minha memória saboreia com gosto as lembranças da infância. Tempo em que tudo era fantástico e possível. Não me preocupava com o que seria quando crescesse. Tinha a tranquila noção de que estaria protegida. Eu nem sabia que existia algo do que se proteger. Minhas amigas brincavam com as jóias, maquiagens e scarpins de suas mães. Transformavam-se em mini-adultas. Não me lembro de ter essas passagens. Na adolescência, as meninas queriam logo chegar aos dezoito, aos vinte e um. Usavam batom vermelho e salto alto para conseguirem entrar nas boates sem que o segurança pedisse a carteira de identidade.

Sempre andei na direção contrária. Por que deixar de ser criança? Não ter contas para pagar, não sofrer por amor, não pensar que existem perigos no mundo. Ser criança é ignorar a diferença entre a fantasia e o real. Somos mais espontâneos, mais criativos. Por mais duras que soem, nossas palavras são engraçadas. E sinceras. Os pais acham bonitinho, até incentivam. Esse conjunto de fatos me faz sentir saudade dos cinco anos. No meu guarda-roupa de adulta tenho várias máscaras: a do trabalho, a da faculdade, a da família. Qual delas será a mais transparente? Se é que alguma delas pode ser.

 Fui muito mais eu quando minha única máscara era a da Mulher Maravilha. Quando eu acreditava que podia voar e que no próximo ano o coelho faria a mesma travessia para garantir mais uma Páscoa feliz.

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De volta ao de sempre

novembro 14, 2009 at 1:28 pm (As minhas)

Renata tem um dom não muito especial: desgastar a paciência daqueles que desfrutam do seu convívio. E isso começou bem antes dela vir ao mundo. Chutava tanto a barriga de sua mãe que a coitada tinha dores abdominais terríveis. Ah, se fosse um menino! Pelo menos poderia ser o novo Fenômeno do futebol. Em seu trabalho, toda vez que um colega fala alguma bobagem, ela diz: Lamentável! Mas, antes ouvir isso que ser surda, né? Nas reuniões de família, ela sempre pede um minuto de atenção para declarar que este é o melhor almoço de todos os já ocorridos, concluindo com uma risada seguida de um desatar de lágrimas. Para Renata, todo o primeiro encontro é um momento de causar impacto. Tamanha é a sua necessidade, que a moça quase deixa seus pretendentes sem olfato. O aroma do seu impacto anuncia a sua chegada muito antes dela acontecer.

Depois de encontros sem continuidade, olhares tortos no escritório, e conversas paralelas ao redor da mesa de domingo, Renata percebeu que havia algo errado. Foi então que ela mudou. Ao ouvir a primeira bobagem no trabalho, fingiu estar desatenta. Passaram-se muitas outras sandices e nada de manifestação. No almoço em família, foram direto para a sobremesa. Para o encontro seguinte, Renata usou apenas um hidratante de perfume suave, como se fosse o da própria pele. A família pensou que a refeição não era mais a melhor de todas, e os colegas acreditaram que estavam falando sério demais. O próximo encontro virou namoro.

Mesmo encontrando um par, Renata carregava um sentimento estranho. Era como se sua vida estivesse acontecendo sem ela. Sentia falta de suas costumeiras intervenções. A família e os colegas também. Suas participações especiais chateiam, mas, quem não incomoda de vez em quando? Foi no seu primeiro aniversário de namoro que Renata teve certeza de que era hora de recuperar a identidade engavetada. Carlos parou o carro em frente a sua casa e, depois de um beijo, veio o presente e a fatídica frase: – Você é linda, mas, desde nosso primeiro encontro, sinto que falta alguma coisa. A namorada desembrulha o pacote com as mãos trêmulas e, surpresa! Um frasco do seu Kenzo preferido. E, junto com ele, um intenso aroma de liberdade.

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A gente se acostuma com o fim do mundo

novembro 6, 2009 at 5:51 pm (As deles)

– Largue ela.

– Vai ser difícil. Ela já foi embora.

– Há quanto tempo?

– Cinco dias. Não tenho nem mesmo como deixá-la. Não tenho nem mesmo como brigar com ela. É frustrante.

– Então, encontre-a, e depois você larga.

Martin Page

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Hoje tem cantada barata? Tem sim senhor!

novembro 6, 2009 at 5:38 pm (As do bar)

Depois de alguns anos circulando pela noite, adquiri uma dúvida existencial: será que existe vida inteligente depois da meia-noite? Estou generalizando o horário, claro. O que considero é a transformação que acontece depois de uma certa hora, quando a cerveja, a tequila ou seja lá o que tiver o álcool que for, toma conta do cérebro. Em uma mesma noite, uma mulher é capaz de ouvir umas dez ou quinze cantadas sem graça. O pior é que, com algumas delas, cola. Será que o pior é não colar? Outra dúvida que me aflige. Ser um pouquinho mais flexível não ajudaria a encontrar o pai dos meus filhos? As várias sessões de terapia ainda não conseguiram me convencer disso. Bom, também não é tão difícil assim de entender. Basta que eu cite um exemplo.

Desculpe, ainda não me apresentei. Meu nome é Alice. No verão, gosto de ir para o bar de uns amigos. Cerveja gelada, atendimento preferencial e a promessa de sempre ter uma boa companhia. Na última temporada, estávamos eu, Larissa e Roberta, sentadas a uma mesa ao ar livre. Conversa vai, conversa vem, entram três caras no bar, escolhem se instalar ao nosso lado. Pelos olhares de conquistadores baratos que pude perceber com o canto do olho, senti que minha tranqüilidade acabaria em alguns instantes. Eu havia sido quase assaltada duas noites antes e estava contando, com toda a minha indignação, o susto que levei. Dizia que não acreditava em reabilitação, que esse tipo de cara tem que morrer mesmo para não aterrorizar mais ninguém.

– Mina, quer dizer então que tu é a favor da violência? Diz um dos seres da mesa ao lado. Para começo de conversa, não me chama de mina. E depois, coisa feia enfiar o bedelho onde não se é chamado, muito menos, bem-vindo. Não respondi, nem sequer olhei para o lado. Continuei a falar com minhas amigas, agora concentrada nas histórias que elas tinham para contar. Fazia tempo que não nos víamos. Mais um pouco de conversa, mais uma intervenção.

– Ei, uma de vocês empresta o fogo? Ok, até aí nada demais. Roberta alcançou o isqueiro. Ela estava curtindo a azaração, afinal, não era o tipo de mulher preferência nacional. Faltava-lhe um bom bocado de atributos para chegar lá. Larissa continuava sem se manifestar, como eu. O isqueiro acendeu a chama para novas tentativas.

– Vocês são daqui? Roberta prontamente respondeu sim, que éramos as três veranistas de Areias Brancas.

– Vão passar o carnaval aqui também? Eu e Larissa já estávamos cansadas da falta de noção das criaturas. Roberta continuava alimentando.

– Escuta mina, tuas amigas engoliram a língua? Pô, nós só queremos conhecer vocês melhor, curtir a noite, três minas, três manos.

Gota d´água. Eu e Larissa levantamos e, sem dar tempo nem escolha para Roberta, fomos para o balcão, onde imaginávamos estar a salvo. Passaram-se alguns minutos, o trio incansável se aproximou novamente. Os meninos não eram feios, mas e quem disse que isso tem tanto valor assim? Dessa vez, chegam com um novo trunfo. Um deles vem ao encontro de Roberta e oferece uma carteira de cigarros. Aproxima-se da mais faceira com um agrado, para ver se consegue uma brecha com as indiferentes. Boa estratégia! Mas a grande sacada não dura mais do que meia hora. O mesmo garoto chega todo desajeitado pedindo o maço de Carlton de volta. Ele diz que havia o achado perdido em uma mesa e que o dono tinha voltado para buscar. Como diria um amigo meu, aí enfraquece! Que falta de talento!

A noite seguiu. Depois de muita Skol, o conceito de beleza dos meninos se tornou relativo e bastante flexível. Roberta ficou com pena da bola fora com o maço de cigarros e voltou para casa mais sorridente. Mesmo vendo a felicidade dela, não me convenço. Será que meu destino é ficar na companhia das amigas, desviando dos cérebros vazios e alcoolizados? Enquanto não encontro resposta para minhas inquietações, continuarei dando boas risadas com o grande circo que só a noite pode proporcionar.

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O que podemos

novembro 4, 2009 at 5:44 pm (As deles)

 fazer ou falar é escrever, é transformar nossa ansiedade em palavras.   Moacyr Scliar

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